07 fevereiro 2017

Ajudar o Povo de Humanas a Fazer Miçanga :)



Nesse vídeo eu gostaria de explicar porque que eu acho que a Página Ajudar o Povo de Humanas a Fazer Miçanga é uma das coisas mais interessantes e mais importantes da Internet brasileira.
Com certeza vocês conhecem a página. Não precisa ficar apresentando. A página foi criada por Niki Vargas, uma jovem curitibana com uma inteligência e um senso de humor muito afiado e com MUITA sintonia com o estado de espírito de toda uma geração.

Fazer a curadoria daquelas sacadas sensacionais da página é um trabalho de edição que merece respeito. Hoje a página conta com uma turma de editores, mas eu gostaria de falar sobre a Niki Vargas porque ela é a fundadora e eu sinto que é um momento importante para ela ter mais um testemunho sobre a importância do seu trabalho.

Em primeiro lugar, os memes, os tuítes e os posts da página tratam de questões universais, que todo mundo sente, mas nem todo mundo tem coragem de admitir que sente.

Os posts falam sobre como a gente é fera em fazer papel de trouxa, em fazer escolhas erradas, em procrastinar e depois sofrer por isso. Falam sobre como a vida adulta é um tédio, uma tragédia, como a nossa vida é sempre um lixo em comparação com aquelas pessoas que encenam uma vida sensacional no Facebook. E claro, tudo em forma de piada.

Mas ao ler isso, todos nós que nos identificamos com esses problemas descobrimos que não estamos sozinhos. Lembrando que o foco da página não são problemas sociais, mas problemas existenciais. Ok, tem post lá reclamando de falta de dinheiro, não está mesmo fácil para ninguém, mas a pegada não é luta política, é uma luta pessoal, universal, de caráter mais existencial mesmo.

Então a página ensina que a gente não precisa ter vergonha de nossa própria vulnerabilidade. E se por um lado parece uma página de gente simplesmente desiludida com a vida, a página tem um caráter libertador, justamente porque desconstrói essas ilusões de uma vida perfeita, tão celebrada na publicidade e nas mídias em geral.

É duro desconstruir as próprias ilusões, mas isso faz parte do processo de amadurecimento. Ninguém é tão feliz, bonito, bem-sucedido ou perfeito como parece ser no Facebook. Somos todos frágeis, estamos todos em crise, cada um com as suas crises particulares, em maior ou menor grau. E é importante saber que a gente não está sozinho. Que tem muita gente sentindo e pensando como a gente.

E outra coisa. Quando a gente faz dessas crises uma tragédia a gente tem mais dificuldade para superar. Mas quando a gente aprende a rir de si mesmo, a não se levar tão a sério, não é que a gente vai simplesmente desistir, mas a gente aprende a levar os perrengues mais de boa.
Até porque, mais uma vez, a gente descobre que a gente não está sozinho.

A página criou uma comunidade cheia de gente tímida, desajeitada socialmente, alguns estudantes, outros desempregados, outros começando a vida profissional, daquele jeito, mas que é gente solidária entre si, mesmo que não falem um com o outro, justamente pela timidez.

Uma solidariedade silenciosa.

Que às vezes até se revela quando as pessoas curtem os comentários.
Mas que está lá, mesmo quando as pessoas não clicam em nada mas gostam de ver. É uma solidariedade de gente que se entende, entende o que o outro está sentido, porque sente isso também. E que compartilha uma piada que expõe as próprias angústias, com humor.

Outra coisa. Nesses tempos em que há tantos conflitos entre o politicamente correto e o politicamente incorreto, a página consegue fazer um tipo humor que transcende isso e aponta caminhos. Porque o que a página propõe não é uma zoeira com os outros.
Mas é um autodeboche. É uma autoironia. A página faz piada com as frustrações pessoais. E são frustrações universais. Não há maldade. Nem cinismo. É um reconhecimento importante da própria fragilidade diante o mundo.

E na verdade é impossível ser politicamente correto ou politicamente incorreto consigo mesmo. Porque é um tipo de humor que ao mesmo tempo em que não precisa medir palavras, não ofende ninguém. É um tipo humor em que o alvo somos nós mesmos.

Quem curte a página e compartilha as publicações ri porque se identifica com a zoeira, veste a carapuça, se vê representada por aqueles lamentos melodramáticos, e ao compartilhar sente à vontade para se expor como o sujeito da piada, o alvo da piada, por livre e espontânea vontade, porque a piada expressa o que ela sente em relação a si mesma.

Tá vendo a diferença em relação ao politicamente incorreto?

Então a página ensina que não tem muito sentido a gente se levar tão a sério. Que a gente é assim mesmo, frágil, vulnerável, cheio de contradições. Que todos temos problemas, inseguranças, dúvidas, medos, desejos e, mais uma vez, frustrações. A gente é humano.

Uma vez eu vi um colega compartilhando uma coisa assim: todo mundo que você conhece está travando uma batalha que a gente nem imagina. Então, no mínimo, seja gentil com os outros, sempre.

No meio de tanta arrogância, fundamentalismos, discursos de ódio, é gente pregando violência física contra adversários políticos, contra religiões, ou contra não religiosos, tem gente que odeia umbandista, tem gente que odeia evangélico, tem gente que odeia ateu, é o cyberbulling, o pessoal doido para fazer um linchamento virtual na primeira oportunidade, o pessoal adora odiar, expressar seu ódio, é gente que ganha dinheiro na Internet caluniando, difamando, apontando o dedo no primeiro erro dos outros, humilhando as pessoas...

Então, nesse contexto, a página Ajudar o Povo de Humanas a Fazer Miçanga nos lembra que não existem heróis ou vilões, bonzinhos e malvados, somos humanos, a gente erra o tempo todo, às vezes a gente quer acertar.. e erra; às vezes a gente fica com preguiça e aí é omisso; a gente sente simpatia por uns, antipatia por outros; a gente tem umas manias bestas, mas a gente é assim, ninguém sabe direito o que fazer com essa vida, somos frágeis, contraditórios, temos dificuldade para expressar nossas emoções..

Então as piadas da página nos lembram que a gente é trouxa mesmo, que a gente perde tempo com furada, que a gente desperdiça a vida, que a gente sofre por isso, mas nem sempre a gente sabe como lidar com isso, que a gente faz bobagens por pura incapacidade de lidar com um mundo tão estranho, e frequentemente hostil, cada um por si, às vezes nem a nossa família nos entende direito, e que por isso, o mínimo que todo mundo merece, qualquer homem ou qualquer mulher, errando ou acertando, é um pouquinho de tolerância e compaixão.


Então era isso que eu queria dizer. É um reconhecimento e um agradecimento a Nikki Vargas e a toda a galera que faz uma curadoria sensacional na página Ajudar o Povo de Humanas a fazer Miçangas. O que não é fácil.

Então Nikki e editores da página, se vocês estiverem vendo esse vídeo,  alguém aí mostra para eles, parabenizo a todos vocês pela inteligência, pela sensibilidade e pelo empenho em fazer essa página que tem um papel humanizador.

A Internet brasileira tem muito a agradecer a você, Nikki, e a todos os editores.


E agora eu me despeço porque no teatro da minha vida, quem faz papel de trouxa sou eu.

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